sexta-feira, 10 de julho de 2009

Conselho

Cerca de grandes muros quem te sonhas.
Depois, onde é visível o jardim
Através do portão de grade dada,
Pões quantas flores são as mais risonhas,
Para que te conheçam só assim.
Onde ninguém o vir não ponhas nada.

Faz canteiros como os que os outros têm,
Onde os olhares possam entrever
O teu jardim como lho vais mostrar.
Mas onde é teu, e nunca o vê ninguém
Deixa as flores que vêm do chão crescer
E deixa as ervas naturais medrar.

Faz de ti um duplo ser guardado;
E que ninguém, que veja e fite, possa
Saber mais que um jardim de quem tu és -
um jardim ostensivo e reservado,
Por trás do qual a flor nativa roça
A erva tão pobre que nem tu vês...


Fernando Pessoa